UEPG homenageia a história do Colégio Agrícola Augusto Ribas

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Casa. Para tantos que passaram pelo Colégio Agrícola Augusto Ribas ao longo de 86 anos, essa é a palavra que melhor descreve o local. Desde 1980, a escola é administrada pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, que neste Dia do Técnico Agrícola (05 de novembro), homenageia a história do Colégio e de todos e todas que por ele passaram. 

Nessas oito décadas, o Caar se tornou referência em ensino de qualidade, tanto no Ensino Médio quanto profissionalizante. Dos 23 colégios agrícolas no Paraná, este é o único ligado a uma instituição de Ensino Superior. São mais de 300 alunos e 30 professores, e as taxas de reprovação e de abandono escolar são baixas. Em 2019, a avaliação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) colocou o Colégio como uma das 30 melhores instituições de ensino médio do Paraná.  

Na sexta-feira (27), caía uma chuva forte em Ponta Grossa. Era dia de prova do processo seletivo do Colégio Agrícola e 260 candidatos buscavam uma vaga no curso técnico em Agropecuária integrado ao Ensino Médio Regular. Para cada vaga, cerca de 2,5 candidatos. Na prova, organizada pela primeira vez de forma integrada com a Coordenadoria de Processos de Seleção (CPS-UEPG), questões de Português, Matemática, História, Lei 4560/02 (Atribuições do Técnico Agrícola), Geografia e Ciências. Das 105 vagas ofertadas todos os anos, 35 são para o internato, voltado aos alunos de outras cidades que precisam de moradia em Ponta Grossa. O resultado foi divulgado na quarta-feira (01) e está disponível neste link. 

Não é fácil ingressar ao Caar. E quem sai do Colégio após três anos de curso, sai com saudades. Para Gabriel Cassiano Orlovski, as palavras que vêm à mente para descrever o local são “Saudade” e “Amizade”. Outros tantos egressos teriam o mesmo relato, e isso fica claro quando cada um deles retorna ao Colégio para visitar, matar as saudades ou cumprir alguma agenda profissional. “Foi um dos momentos de crescimento, tanto pessoal quanto profissional. Conheci novas pessoas, fiz amizades, aprendi uma profissão”, resume Gabriel. 

Eu sou filho de produtor rural, nasci e cresci na roça”, conta Gabriel. Nas lavouras de fumo, feijão, milho e soja do pai e dos irmãos em Ipiranga-PR, encontrou inspiração para a escolha profissional. Mas a motivação, mesmo, veio do sonho da mãe de que algum dos filhos fizesse o Colégio Agrícola. “Eu falei: vou realizar esse sonho”. 

Era a primeira vez que Gabriel saía da casa dos pais. No alojamento masculino do Caar, ele forjou suas melhores lembranças do período e amizades com ex-colegas, professores e funcionários, que ainda cultiva. “As brincadeiras, o companheirismo, as noites de lanche, tudo isso são lembranças que parecem ser bobas, mas que me marcaram muito nesse tempo”.

Diretamente da formatura no Agrícola, em 2017, ele ingressou no curso de Agronomia da UEPG. “Tive uma preparação muito boa, que me deu uma base excelente. Pude ter um entendimento melhor das matérias do curso de Agronomia graças ao Colégio Agrícola”. 

Técnico em Agropecuária

O curso técnico em Agropecuária forma profissionais para prestação de serviços técnicos e orientação a produtores rurais em atividades ligadas à agricultura e pecuária. Os graduados no Colégio Agrícola saem preparados para orientar e realizar a administração de empresas rurais, granjas e campos experimentais; comercialização de produtos agropecuários; assistência técnica e extensão rural; preparo do solo, envolvendo arações, gradeações, locações de curvas de nível, aplicação de corretivos e práticas de conservação de solo; uso de máquinas e implementos agrícolas, operações de plantio, uso adequado de agroquímicos e técnicas culturais, colheita e comercialização; instalação de sistemas de irrigação e drenagem; manejo de pequenos e grandes animais, melhoramento de raças e inseminação artificial; medições topográficas; além de supervisionar as tarefas de campo dos trabalhadores nas áreas da agricultura e pecuária.

“Educação e técnica a serviço da agricultura”. O lema estampa o espaço entre o Restaurante Universitário (RU) e o Alojamento Masculino, acompanhado de um mosaico que retrata uma cena rural, com araucárias, gado e trator, e um estudante. “A grande maioria das pessoas que passaram aqui, sejam professores ou servidores, tinha e tem um sentimento, uma preocupação em realizar seu trabalho da melhor forma possível, buscando não o crescimento pessoal (para se aparecer), mas sim o crescimento coletivo e principalmente manter o legado do colégio”, declara Diógenes Spartalis, coordenador de estágio e professor do Caar. 

Diógenes também é egresso do Agrícola. Formado em 1990, serviu no Exército Brasileiro e logo retornou para “casa”, como professor, em 1992. “É como uma família, você acaba criando laços que muitas vezes perduram por longos anos”. No decorrer de 31 anos, ele exerceu diversas atividades: ministrou aulas práticas; manutenção do viveiro de mudas; implantação de um horto medicinal; preparo do solo e manutenção das hortas, com trator e implementos; foi responsável pela manutenção do Colégio por um período. Em janeiro de 2010, assumiu a coordenação do estágio supervisionado: em pecuária, para os alunos do 2º ano, e em agricultura, para o 3º ano. “Oriento desde a escolha do local de estágio e a realização do mesmo, até como escrever o relatório (parecido com o TCC) e como apresentar seu estágio para uma banca de professores”, explica. 

Para ele, a realização vem quando encontra ex-alunos em boas colocações no mercado de trabalho. “É muito gratificante ao percorrer fazendas, sítios e cooperativas, encontrar ex-alunos como técnicos, agrônomos, zootecnistas ou veterinários, e outros como produtores ou gerentes. Sem contar as outras profissões”, conta. “O sentimento que tenho é de que aqui é um local onde valorizamos o ensino público e gratuito”. 

“Tenho convicção que toda vez que alcançar uma vitória pessoal ou profissional vou lembrar da sólida base que o Colégio Agrícola me ajudou a lapidar”, acentua o egresso Jackson Gaudeda. Para ele, que se formou em 2019, o curso abriu portas que ele nem imaginava existir. Hoje acadêmico de Agronomia, Jackson atua como técnico agrícola no ramo de sementes de soja. “Sou extremamente realizado no que trabalho e grato às oportunidades que tive através do curso”, diz. Ele resume o sentimento em três palavras: “Saudade do ambiente, amigos e experiências. Gratidão pelo ensino, oportunidade e em especial pelos conselhos de vida. Por fim, recomendação para aqueles que estão no ensino fundamental e ainda podem passar por essa experiência única que é o Caar”. 

Encontrar ex-alunos bem-sucedidos em suas profissões também é o que motiva a professora Claudia Nekatschalow. “Não tem preço. É emocionante e faz ver que lá atrás todo aquele trabalho valeu a pena”. Ela, que é médica veterinária, leciona no Colégio desde 2004. “Além de preparar os alunos para aquelas matérias básicas que o currículo exige, ele também prepara para a vida, para o mundo”, relata, sobre o método de ensino utilizado. Segundo Claudia, os estágios e saídas técnicas permitem aos alunos ter uma interação com o dia a dia real de propriedades rurais, plantações, criações de gado e outros animais. “Essa convivência com os proprietários diretamente gera alunos mais aplicados e que têm consciência do que vão enfrentar depois que saírem da escola”. 

Família

Não tem como falar de Colégio Agrícola sem falar de Alcebíades e Felomena Baretta. Ambos egressos, dedicaram a vida à gestão e funcionamento da escola. Hoje, ele é diretor; ela, coordenadora do internato. 

Era 1976 quando Felomena ficou sabendo, por meio de um tio, de um colégio que tinha internato. “Eu cheguei aqui sem saber o que era o Colégio, né”, brinca. “Eu cheguei menina, com 14 anos, e vou sair idosa”. Adolescência, fase adulta, casamento, filhos, a maturidade. Todas as fases foram vividas no Agrícola. Felomena fez o curso de Economia Doméstica, em que se formou em 78, foi fazer a faculdade de Pedagogia e retornou em 1981 como funcionária. 

Nesse retorno, um encontro do destino. Em 78, Alcebíades Baretta havia deixado Capinzal (SC) para estudar. Numa das festas e bailes, eles se conheceram e começaram a namorar. Casaram já no ano seguinte. 

“Eu não me via em outro lugar senão lidando com agricultura. E por sorte, ou por destino, eu parei aqui no Colégio Agrícola. E estamos aí até hoje!”. Lá do interior de Santa Catarina, Baretta escolheu seguir os passos do primo, que já havia estudado por aqui. Foi interno e bolsista: ajudava a cuidar do local, servia refeições no Restaurante Universitário, se envolvia em tudo que podia. Depois de formado, até chegou a trabalhar em outro lugar, mas o destino de Baretta estava ligado ao Colégio Agrícola Augusto Ribas. Foi contratado como técnico agrícola, para ministrar aulas práticas, em 1984. Depois, fez licenciatura em História e pós-graduação em História do Paraná. 

Formado pela primeira turma do Agrícola depois que o Colégio passou a ser administrado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, Baretta fala com propriedade sobre a importância dessa relação e suporte da instituição. Segundo ele, a estrutura de laboratórios, administrativa e suporte técnico oferecidos pela Universidade permitem que os alunos aprendam mais e melhor, tenham contato com os cursos de graduação e que haja um acompanhamento mais próximo de estágios, por exemplo. “Em julho, foram feitos mais de 1800 quilômetros e visitadas cerca de 50 propriedades em que os alunos fazem estágio, tudo com o suporte logístico da UEPG. É um diferencial muito grande com relação aos outros Colégios Agrícolas”, conta. 

Em 1997, Baretta assumiu a vice-direção; em 2005, tornou-se diretor. Ficou à frente do Colégio Agrícola até 2014 e retornou em 2018 ao cargo que ocupa até hoje. O objetivo que o leva a trabalhar duro todos os dias? “Devolver para família uma pessoa, um profissional, muito melhor do que chegou aqui na escola”. Os alunos, para ele e Felomena, são como filhos. 

“Uma palavra para definir, aqui? Casa”. Felomena diz que a primeira casa deles é com os filhos e família, e a segunda, no Colégio, com uma família enorme composta por alunos e funcionários. “É a minha vida, eu amo trabalhar aqui, gosto, respiro isso, me sinto feliz aqui dentro. Eu levanto de manhã com vontade de vir, rever, de ajudar, de servir os alunos… Fazer tudo aquilo que alguém um dia fez por mim”. 

(Re)Encontro

Aos poucos, iam chegando carros e mais carros para quebrar a monotonia do Campus vazio em pleno recesso administrativo e acadêmico. Era sexta-feira, 13 de outubro, e um temporal na noite anterior havia causado destruição em todo o sul do Brasil. No Campus da UEPG, árvores caíram, galhos e grimpas salpicavam o chão e um ou outro telhado teve que ser substituído. 

Mas o mau tempo não impediu cerca de 150 pessoas de virem de todo o Brasil e até do exterior para matar a saudade do Colégio Agrícola. O espaço entre o Restaurante Universitário e o alojamento masculino rapidamente foi preenchido com pessoas, abraços, risadas e conversas em tom nostálgico. 

Um dos organizadores era José Nilton Sanguanini. Ele fazia parte de um grupo de alunos, nas décadas de 1970 e 1980, que veio do interior de Santa Catarina. Ele era de Ouro e se formou em 1982 no Técnico Agrícola. “A gente veio pra cá buscando uma alternativa”. A voz embarga com as lembranças e é preciso fazer uma pausa. 

Eram 14 alunos contemporâneos de José Nilton, todos da mesma cidade. “Já tinha um pessoal de Santa Catarina que veio primeiro para o Colégio Agrícola”, lembra. A rotina da produção agrícola nas propriedades familiares desses alunos era pesada. “A gente lavrava a boi, um sofrimento”. A possibilidade de aprender a trabalhar com tecnologias agrícolas, além da oportunidade de formação profissional e a perspectiva de já sair empregados com bons salários atraiu os alunos. 

Com bolsa de estudo, Sanguanini ajudava na manutenção do Colégio, cuidado com animais e plantações. Todo esse cuidado gerou um carinho e identificação com o local, para o qual ele retorna com nostalgia. “Tá vendo esse pinheiro? Eu que plantei”, mostra, orgulhoso. Logo em frente ao RU, a araucária se ergue majestosa acima dos dois andares do edifício.

“A escola foi o que me abriu portas, me deu conhecimento e a bagagem para enfrentar as coisas lá fora”, agradece Sanguanini. Depois de formado técnico agrícola, ele chegou a trabalhar no próprio Caar, depois no Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), em Pato Branco, onde também foi Secretário de Agricultura e de Meio-Ambiente por três gestões.

Bandeijão de metal, com divisórias para os alimentos; caneca azul de plástico; jarras com suco nas mesas. Quantas lembranças! Os “abrigueiros”, como se chamam os egressos do Caar, fizeram questão de comer novamente no Restaurante Universitário, para matar as saudades da rotina que tinham quando alunos.

Em meio aos ex-alunos de diferentes épocas, destacavam-se os cabelos brancos de Heimo Westphal. Ele foi professor do Colégio entre 1976 e 2014 e reencontrou muitos pupilos no evento. Nesse período, ele lecionou diversas disciplinas: matemática, física, irrigação, hidrologia, construções, habitação e decoração.

Com orgulho, Heimo destaca a qualidade na formação ofertada pelo Agrícola. “Eu considerava como a melhor escola de Ponta Grossa”. Além disso, eram importantes os momentos de confraternização e camaradagem oportunizados pelo fato de haver o internato. “O pessoal se reunia na praça para tocar violão, tomar chimarrão, contava causos”, lembra.

Para Juraci Strieder, o Colégio teve um papel importante para dar um “pontapé inicial” na carreira profissional. Ele, que veio de Marechal Cândido Rondon, no oeste do Paraná, para estudar em Ponta Grossa, já passou por todo o país e morou por anos no Ceará. Hoje, vive em Santa Catarina. Bafu, como era conhecido, era o esportista da turma. Corria, praticava esportes, chegou até a jogar no Operário Ferroviário Esporte Clube. 

A experiência dele com o Agrícola foi similar à de tantos alunos que, no interior do Paraná, já tinham experiência com a vida no campo e que vieram se profissionalizar e ter contato com outras realidades. “Eu nunca tinha saído do interior, e eu percebi que o mundo era diferente”. 

Disciplina e amor

Na capelinha montada no alojamento feminino, com os genuflexórios conquistados por ela mesma, Edemê Tozetto fez uma rápida oração. “Ah, que saudade”, suspirou, atravessando a praça entre o Colégio e o Restaurante Universitário e admirando as árvores que tanto cresceram desde a última vez em que ela esteve ali. Para quem trabalhou no Colégio Agrícola por 44 anos, o retorno após a aposentadoria é cheio de nostalgia.  “O Agrícola foi minha vida”, declara. “Cada vez que eu encontro um ex-aluno, é ‘mãe’ daqui, ‘tia Edemê’ dali, ‘dona Edemê’… Como eu gostava do que eu fazia”. 

Edemê foi aluna da primeira turma de Economia Doméstica do colégio, em 1967 e se formou em 1969. “Nós éramos a primeira turma de meninas e fomos recepcionadas e tratadas ao longo do curso com um carinho especial”, rememora. Durante o estágio, com a dona Ruth Holzmann Ribas, aprendeu de perto a fazer a gestão do internato. Já no ano seguinte, foi contratada como auxiliar nas aulas de puericultura, foi cursar Pedagogia e ficou no Caar até se aposentar, em 2014. 

Em meio a memórias e mais memórias, Edemê conta que até o pedido de casamento feito pelo seu marido tem a ver com o Colégio. Rindo, aponta na foto o local exato em que deixou de ser namorada e passou a ser noiva, no antigo portal que saía para a Alameda Nabuco de Araújo. Hoje, aquela entrada não existe mais.

Nos relatos sobre a orientadora, uma mescla de carinho e de histórias da disciplina, necessária, segundo ela, em um colégio com internato. A gente passava conferindo se as camas estavam arrumadas, não podia namorar, tinha que ter disciplina. Mas mesmo nos momentos de corrigir os alunos, tinha uma dose de carinho. “Eu defendia quando os alunos precisavam que eu defendesse”, conta. Enquanto revisitava o Colégio e os alojamentos, passa por uma turma de alunos. O velho hábito vem à tona mesmo sem querer: mãos para trás, o olhar amigável, a conversa amistosa, mas firme. Edemê continua sendo a “mãezona” de sempre. “Eu tenho uma gratidão pelo Colégio Agrícola pelo que eu fui e pelo que eu sou”.

História

Um prédio imponente, de dois andares, se erguia sozinho em meio a um campo. Nas fotos antigas, não fica claro o local onde ficava a primeira sede da Escola de Trabalhadores Rurais Augusto Ribas – instituição que depois se tornou o Colégio Agrícola. Hoje, e desde setembro de 1966, o CAAR funciona em um complexo de edifícios na Alameda Nabuco de Araújo.

Mas para Antonio Carlos das Flores, egresso do Caar, o local ficou marcado na memória. “Era no antigo Parque de Exposições de Ponta Grossa. No trevinho que vai para o Rio Verde e para Alagados”. A área onde funcionou o Parque de Exposições de Ponta Grossa hoje abriga a Reitoria da UEPG e o portal de acesso ao Campus Uvaranas. 

“Desde jovem, eu gostava muito dessa vida de campo, dessa vida agrária”, lembra Flores. Depois de se formar no Colégio Agrícola, em 1968, foi fazer Agronomia no Rio Grande do Sul, voltou para Ponta Grossa e trabalhou na Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), em uma empresa de planejamento e topografia e, por 30 anos, no Ministério da Agricultura. Mas o início de toda essa trajetória foi no Agrícola. “Aqui foi minha segunda casa. Eu considerava todos os colegas como meus irmãos, era muito bem recebido e muito bem tratado aqui, como eu tinha muito respeito por todos”, lembra. 

A Escola de Trabalhadores Rurais foi fundada em 17 de setembro de 1937, pelo Interventor Manoel Ribas. No nome da instituição, o ponta-grossense que ocupava o maior cargo político da Província do Paraná legou uma homenagem bem pessoal: Augusto Ribas, também político, era seu pai. 

Nos anos 1930 e 1940, foram inauguradas 11 escolas agrícolas no Paraná (Curitiba – Campo Comprido, Piraquara, Paranaguá, Curitiba – Carlos Cavalcanti, Ponta Grossa, Castro, Palmeira, Rio Negro, Guaratuba, Ipiranga e Reserva). Destas, a Escola Augusto Ribas era a que tinha a maior capacidade, para 110 alunos. O objetivo era atender, em especial, às crianças das classes mais baixas, e capacitar mão-de-obra para a agricultura e pecuária, importantes áreas econômicas da região. 

Desde o início, as aulas teóricas e práticas abordavam conteúdos relacionados à agropecuária, mas também formação básica e complementar, com cursos como carpintaria, selaria e ferraria. Os alunos também recebiam alimentação, vestuário e assistência médica e odontológica. 

Cursos e mudanças

Em 1944, a Escola começou a oferecer, além do curso primário, o curso de Ensino Rural completo, com a certificação ao fim do curso de “Lavrador”. A partir de 1956, o curso passou a ser de “Iniciação” e de “Mestria Agrícola”, que correspondiam às séries finais do Ensino Fundamental. Os cursos técnicos em Agricultura e em Zootecnia, equivalentes ao ensino médio profissionalizante, surgiram em 1960. 

Uma portaria do Governo do Paraná transformou todas as Escolas de Trabalhadores Rurais em Colégios Agrícolas, em 1962: surgiu o nosso Caar, com o nome que defende até hoje, e oferecendo o curso de Técnico Agrícola. 

Novos cursos foram surgindo: o de Economia Doméstica funcionou de 1967 até 2002. Em 1969, foi implantado no Colégio o primeiro curso de Técnicos Florestais do Brasil, que funcionou até 1972, quando foi transferido para Irati. Também em 1969, o Colégio mudou para um novo endereço, dentro da mesma área que hoje abriga o Campus Uvaranas. 

O projeto inicial do prédio de 1937 era para receber um Abrigo para Menores. E no fim das contas, foi essa uma das funções que a Escola cumpriu: receber com carinho e disciplina alunos e alunas que passariam a morar no local.

Abrigueiros

O Colégio Agrícola foi lar para muitas pessoas, como Bianca Helenice Taborda Gunha, que se formou em Economia Doméstica em 1985. Aos 11 anos, ela havia perdido pai, mãe e um dos irmãos em um acidente. “Pense quando você tinha tudo e mais um pouco. E, de repente, a gente não tinha mais nada”. As tentativas de morar com uma tia não deram muito certo. “Eu conhecia um monte de gente que estudou aqui e resolvi fazer o teste”.

A menina que aprendeu com a mãe a bordar, fazer crochê, cozinhar e fazer conservas havia se tornado uma adolescente rebelde. Bianca ri ao recordar de todas as travessuras que aprontou no Colégio. “Eu roubava ovo do galinheiro para jogar nos juízes na época dos Jogos da Primavera, fazia mutirão pra gente fazer aquelas torcidas terríveis, abaixo-assinado para tirar a orientadora”. Frequentava a sala da orientadora Edeme dia sim, outro também. “Quando ela não vinha, eu não ia”, ri.  “Aqui eu tinha as minhas encrencas, mas eu tinha quem me protegia. Me sentia acolhida”. Por trás da menina rebelde, havia a Bianca insegura e carente de atenção. “Hoje, eu sei que era a minha maneira de chamar um pouco de atenção para ter aquele retorno amoroso”. 

No retorno ao Colégio, Bianca pôde visitar os alojamentos onde morou há cerca de quarenta anos. Depois de três filhos, três netos, uma carreira como psicanalista e dona de uma malharia, ela olha para trás e vê que os anos que passaram no Colégio ajudaram a moldar seu caráter e construir relações que duram por toda a vida. “Aqui era minha família”, diz. “São amigos não de escola, mas de vida. Onde eu vejo eu sou a mesma, vou lá correndo, dou abraço, beijo. Eu nunca deixei de ser aquela maluquinha de sempre, com o coração gigante, que gosta de ajudar todo mundo”.

Festas

Na foto antiga, as pessoas visitam barracões e estandes. No portal de entrada, lê-se: “1ª Exposição Paranaense de Animais e Produtos Derivados”. Era um dos primeiros eventos organizados pela Escola de Trabalhadores Rurais, em 1938, e daria o tom para o papel desta instituição, por décadas, de organizar e promover importantes eventos agropecuários e festivos em Ponta Grossa. 

Depois da mudança para o novo – e atual – prédio, o espaço da Escola ainda foi utilizado como Parque de Exposições por duas décadas, antes da criação do Campus Uvaranas da Universidade Estadual de Ponta Grossa. 

Além das feiras e exposições, havia um evento em especial que faz parte do imaginário do Colégio Agrícola: a festa do Pinhão. “Era uma semana de festa”, lembra Douglas Panzarini Taques, egresso do Caar e atual vice-diretor. 

Na programação, shows, apresentações culturais e bailes, e a tão esperada apresentação da Dança dos Facões. “Quem participava da Dança era só os ‘caras’ boa-pinta, ajeitados. Quando se pilchavam para dançar, era uma maravilha”. Pilcha é a roupa do gaúcho, cultura enraizada nos Campos Gerais do Paraná, e essa dança, uma manifestação folclórica ligada aos tropeiros, em que homens faziam demonstrações de habilidade em movimentos ritmados e marcados pela música, com facões nas mãos. 

Douglas começou a dançar em 1982, e em 1985, quando começou a trabalhar no Colégio, logo se tornou o professor da dança. Para participar, era preciso coragem e disciplina, com treinos todos os dias. 

A cozinha, onde eram preparados o pinhão e o quentão, funcionava com cerca de 20 pessoas. Antes mesmo, uma equipe ficava uma semana “no mato”, como conta Douglas, para fazer a coleta dos pinhões. “Era maravilhoso”. 

Quebrando paradigmas

A primeira mulher a se formar Técnica Agrícola pelo Caar é enfática: “O Agrícola mudou o rumo da minha vida”. Em 1974, quando entrou no curso, Gisela Introvini precisou deixar claro que a inscrição não era para o curso de Economia Doméstica, normalmente escolhido pelas mulheres da época, mas sim para a formação agrícola. Foi necessária a intervenção do professor Domingos Ferreira da Cunha, que defendeu que já existiam mulheres veterinárias e agrônomas e que a experiência poderia ser positiva para as novas profissionais. 

“Foi a primeira quebra de paradigmas que enfrentei na minha vida”, define. Depois de formada, trabalhou e prestou assessoria a diversas cooperativas. Doze anos depois, casada e com dois filhos, foi fazer a graduação em Agronomia. “Com o curso Técnico Agrícola, engenheira agrônoma e trabalhando nas cooperativas do Paraná, consegui entender a agricultura do Sul do Brasil”. Em 1998, foi encarar um novo desafio, desta vez no Maranhão, onde vive até hoje. “Estas experiências acumuladas do Sul ao Norte/Nordeste me permitiram ultrapassar fronteiras”, conta Gisela, que já viajou o mundo para palestrar sobre sustentabilidade no campo.

Com a base sólida proporcionada pela formação de profissionais em instituições como o Colégio Agrícola Augusto Ribas, enfatiza a agrônoma, é possível amparar o produtor rural e implantar tecnologias inovadoras, aumentar a produtividade e fazer uma agricultura sustentável e regenerativa. “Essa base é o que o Colégio Agrícola Augusto Ribas me proporcionou para ser a profissional de sucesso que hoje eu sou”.

Texto: Aline Jasper | Fotos: Aline Jasper, Gabriel Miguel, Acervo Museu Campos Gerais, Acervo Museu Cenas, Arquivo CCom-UEPG, Arquivo Pessoal dos Entrevistados

Diretores do Colégio Agrícola
Bell | 1937-1939
Osvaldo | 1939-1940
Junqueira | 1940-1942
Balbino B. de Souza | 1942-1943
Alecarino | 1943-1944
Bartolomeu | 1944
Rubens Amaral | 1944
Dias | 1944
Harry Weckerlin | 1944
Antonio Machado | 1944-1946
Vitor Costa | 1946-1949
Ubiratan Sá | 1949-1952
Nelson Frehse | 1952-1967
Pedro Gorte | 1967-1971
Wilson Rocha | 1971-1973
Walteno de Oliveira Viana | 1973-1974
Pedro Acir Gasparello | 1974-1978
Luiz Mourão | 1979-1981
Rolf G. H. Loose | 1981-1996
Vera Márcia Simoneti | 1996-2004
Alcebíades Antonio Baretta | 2006-2014
Jail Bueno | 2014 a 2018
Alcebíades Antonio Baretta | 2018-hoje


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