Programa da UEPG para imigrantes já atendeu 140 pessoas

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Suporte para quem precisa construir uma nova vida no Brasil: esse é um dos principais objetivos do projeto Processos Migratórios e Intercâmbio: Inclusão Social e Diversidade Cultural (Promigra), da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), que já atendeu mais de 140 pessoas em três anos de existência. Os dados são da coordenação da iniciativa. O Promigra é interdisciplinar e envolve os Departamentos de Serviço Social, Jornalismo, Pedagogia e Estudos da Linguagem da UEPG. As atividades incluem ações sociojurídicas, cursos de língua portuguesa, rodas de conversa sobre xenofobia e propostas educativas para crianças.

Os estudantes são de vários países, com prevalência, para o ano de 2025, de venezuelanos e cubanos. Em busca de novos caminhos, de oportunidades pessoais ou para se afastar de cenários políticos conturbados, Ponta Grossa tem sido a cidade escolhida para os recomeços de famílias que desejam escrever uma nova história ou que, mesmo morando há muito tempo no município, entendem ser importante aprender um novo idioma e socializar para conhecer novas culturas.

É o caso de Yvis Rincões, venezuelana de Puerto Ordaz, Estado de Bolívar. Ela saiu do país natal por conta do quadro político instável. Acompanhada do marido, primeiro foram para a Colômbia, depois Equador e, em seguida, para o Peru. Porém, quando o presidente daquele país, Pedro Castillo, foi deposto em 2022 e sua vice, Dina Boluarte, assumiu em meio a violentos protestos que deixaram mais de 50 mortos, Yvis entendeu que era hora de procurarem um local mais tranquilo para viverem. “Então, começamos a ver que as coisas estavam piorando pela condição de revolução que chegou ao Peru também. Não queríamos passar pela mesma situação em outro país, fora de nossas casas e passando mais necessidade”, recorda.

Foi assim que tomaram a decisão de atravessar a fronteira por Assis Brasil, no Acre, e depois se dirigirem para Brasiléia, no mesmo estado. Dali, por intermédio da Cáritas, uma organização humanitária ligada à Igreja Católica, tomaram Ponta Grossa como destino. Ficaram morando com amigos por duas semanas e, com as economias que haviam juntado ainda quando moravam no Peru, alugaram uma casa e conseguiram emprego. “Ele começou a trabalhar em uma oficina automotiva. E eu trabalhei em uma clínica fazendo terapias: sou massoterapeuta”.

Em dois anos na cidade, Yvis saiu do emprego e começou a empreender no próprio negócio, com clientes fixos. O marido foi trabalhar como motorista em uma empresa de transporte de resíduos orgânicos e recicláveis. Segundo ela, ambos estão felizes e os planos já são outros: trazer os três filhos que ainda moram na Venezuela. “Todos são adultos. Quero que eles venham para estudar aqui, construir uma carreira. E tem nossas mães para virem também”, conta Yvis, em um momento de intervalo de uma aula na qual aprendia sobre os povos indígenas que habitam o Paraná.

Do árabe ao português

Em 1995, o Iraque estava sob o regime de Saddam Hussein e enfrentava uma profunda crise humanitária, agravada pelo isolamento internacional. Isso porque havia severas sanções econômicas impostas pela ONU após a Guerra do Golfo (1990-1991). A população civil enfrentava escassez generalizada de alimentos, medicamentos e outros bens essenciais, resultando em pobreza disseminada, um sistema de saúde em colapso e crescente desnutrição, enquanto a promessa do programa “Petróleo por Alimentos” ainda não havia se materializado para aliviar o sofrimento generalizado.

Naquela época, a família de Zainab Kamil morava na capital iraquiana, Bagdá, e entendeu que era hora de buscar um novo rumo para criar os dois filhos, ainda crianças. O irmão dela morava em Curitiba havia 10 anos, e foi então que Zainab decidiu que era hora de procurar um novo lar. O país eleito foi o Brasil.

Ela, o marido e os dois filhos moraram em São Paulo, Santa Catarina e depois vieram para o Paraná. Zainab interagia pouco com a comunidade brasileira, por não falar português e porque em casa só falavam e consumiam programas de entretenimento e informação árabes. Em Foz do Iguaçu nasceu o filho caçula de Zainab.

O tempo passou, os três filhos cresceram, e Ponta Grossa foi a cidade que os acolheu, em 2003. Os três jovens estudaram, se formaram em Direito na UEPG e hoje atuam na área. Um deles, Reshad Tawfeiq, é professor efetivo do curso em que se graduou na Instituição. “Ele é estudioso, se dedicou muito. E tudo deu certo, graças a Deus. A gente sofreu muito”, lembra ela.

Zainab e Reshad na formatura do primeiro ano de curso (Foto: Aline Jasper)

E a vida de Zainab também passou por mudanças após o fim do relacionamento com o esposo, o que a levou a decidir que era o momento de voltar aos estudos, especificamente do idioma português. “O português está melhorando, cada dia melhor. Adoro português”, comemora a aluna do Promigra, que está na turma intermediária, no segundo ano de aprendizado.

Porém, os laços com o Iraque continuam sendo mantidos. “Tenho família lá e o contato é diário, nunca perdi”, afirma, declarando amar o Brasil como segunda pátria e dizendo-se feliz, fazendo novas amizades justamente por conseguir se comunicar melhor por conta do curso.

O filho do meio, Reshad Tawfeiq, recorda-se da vida em Bagdá: “Tenho lembranças do Iraque. Recordo de uma vida intensa, meus pais eram funcionários públicos e jogadores profissionais de xadrez; fazíamos muitos passeios, viagens e atividades culturais”, relata o docente.

Sobre a mãe, que agora é estudante, ele tem apenas bons sentimentos. “Tenho muito orgulho da minha mãe. Ela tem demonstrado uma dedicação muito intensa para estudar português, e o programa de atendimento a imigrantes da UEPG tem permitido oportunidades incríveis a ela. Mais do que o estudo de um novo idioma, a participação dela em atividades com demais membros da comunidade tem trazido um forte sentimento de inclusão, acolhimento e pertencimento”, ressalta Reshad.

Um trabalho completo

A professora Lenir Mainardes da Silva, do curso de Serviço Social, coordena o Promigra. Ela é uma entusiasta do potencial da iniciativa e comemora cada conquista dos participantes. “Não é só ensinar o idioma, é acolher uma pessoa que está vindo de uma situação vulnerável. Nós acabamos ajudando a aprender a cultura brasileira, auxiliamos com documentação, escutamos a pessoa e tentamos fazê-la se sentir bem. Às vezes, o indivíduo só quer mesmo conversar, contar a própria história”, comenta a docente.

Lenir também destaca a parceria com a Cáritas para o sucesso do programa. “Eles são responsáveis pelo primeiro contato e nos auxiliam também durante o percurso dos alunos”, explica. “É importante ressaltar que ainda existe certo estigma sobre os imigrantes e, ao virem estudar, eles mostram que querem e estão se esforçando para se adaptar à nova realidade. Então, é fundamental que o Promigra tenha visibilidade”, completa.

Aluna da professora Lenir, Amanda Meira está concluindo o curso de Serviço Social. Seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) reflete a vivência de dois anos junto ao Promigra. Ela pesquisa a percepção dos pais e responsáveis imigrantes sobre a inserção dos filhos na Rede Municipal de Ensino, o que demonstra como o trabalho do Promigra atende a demandas tanto da comunidade quanto de discentes da própria UEPG. “Eu vejo como uma demanda muito importante, porque a educação abre as portas para muitas outras oportunidades”, define a formanda.

Para 2025, o programa já está com as vagas preenchidas, mas, segundo Lenir, há previsão de novas turmas para 2026. Neste ano, as aulas têm sido às terças-feiras, à tarde e à noite, e às sextas-feiras, também no período noturno.

Texto: Helton Costa/Fotos: Helton Costa e Aline Jasper

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